segunda-feira, outubro 26, 2009

netuno

No meio dos outros, no meio do que é dos outros encontro pistas do que deixei inscrito em cavernas antigas.

Não é meu, nem nunca foi.

Com tinta ocre gravo a história que invento pra mim.

É dos outros. É dela, não é meu. É dele, não é meu.

Insisto em pegar um pedaço que me é oferecido e esqueço da parte que realmente me cabe.

Fico tonta com o que não me pertence.

Em meio a tanta alteridade, percebo que sou dona de tudo!

E que essa história escolhi pra mim desde os tempos em que se pintava em cavernas e o bicho morria mais fácil pra gente comer.

quarta-feira, outubro 21, 2009

bobos de amor

Jamais poderia ter um cão. Sou boba de amor e cachorros também são. Nos encantaríamos um pelo o outro, amaríamos o nosso amor e nossa capacidade de amar. Devotados a nós mesmos, não mais sairíamos de casa. Lamberíamos um ao outro e seríamos felizes com modestas quantidades de ração porque, apaixonados, comeríamos pouco e largaríamos o osso.

a gata que ri

Giulietta se funde às minhas pernas, me diz boa noite e sorri seu sorriso de gata.

quarta-feira, outubro 14, 2009

lacuna

Na verdade já sabia o final da história desde que resolveu colocar os pés naquelas águas. Os enredos repetiam-se, mas os pés teimavam em continuar ali. A água quente seduzia-lhe. "Depois não diga que não te avisei", dizia pra si mesma. Mas às vezes a vida não é tão exata e a água não é tão límpida. Às vezes se gosta do azedo. E o escuro parece a melhor saída. Mas se eu tivesse uma filha com os pés molhados por essas águas, diria:



(Eu não tenho filhos e a lacuna se faz).

quarta-feira, outubro 07, 2009

casamentos

Era um casamento na praia. Chegamos cedo. "Vamos andar pela praia?". Pés paulistanos sedentos de areia e sal do mar. Fomos. Noiva se arrumando. Noivo arrumando a festa. Comemos queijo coalho no palito. Silêncio. Casamento dos outros. De repente começou a chover. Chovia. Chuva grossa e gelada. Eu e você embaixo de um guarda sol. Completamente ilhados. Impossível atravessar a tempestade. Parados no que restava de areia fofa vendo a chuva endurecer os outros grãos. Silêncio. Nos casamos de novo. Mas agora sem a ilusão que uma cerimônia de casamento cria.